Gravado dois anos após a morte de sua mãe Dona Canô, disco remete à infância da cantora na cidade baiana de Santo Amaro da Purificação
por Tárik de Souza
Alçada ao sucesso nas asas
pontiagudas do Carcará, em 1965, Maria Bethânia logo depôs as armas de cantora
de protesto e se estabeleceu como diva dramática, arrebatadora de multidões.
Foi uma das pontas do quarteto Doces Bárbaros – ao lado do irmão Caetano
Veloso, de Gilberto Gil e Gal Costa – sem se engajar no credo tropicalista. E
há mais de uma década deixou a órbita das grandes gravadoras, em busca de
álbuns cada vez mais pessoais, sem ingerências do mercado.
Gravado dois anos após a
morte de sua mãe Dona Canô, aos 105 anos, o intimista Meus Quintais, de
instrumentação despojada, remete à infância da cantora na cidade baiana de
Santo Amaro da Purificação. Mas não se trata de imersão saudosista. Mesmo a
toada Lua Bonita (Zé do Norte/Zé Martins), da trilha do épico filme O
Cangaceiro, de Lima Barreto, de 1950, ganha o acompanhamento dos chorões
vanguardistas do grupo Tira Poeira.
E a grisalha Mãe Maria
(Custódio Mesquita/David Nasser), sucesso de Nelson Gonçalves, de 1943,
ressurge em sua voz cálida, emoldurada apenas pelo violão de Maurício Carrilho.
O samba de roda do Recôncavo
cintila no inédito Candeeiro Velho (Roque Ferreira/Paulo César Pinheiro), tal
como a ambiental Folia de Reis (só de Roque), escudada no acordeom de Toninho
Ferragutti. No quintal universalista de Bethânia ainda cabem da Moda da Onça
(Paulo Vanzolini), tangida pela viola de Paulo Dáfilin, ao enclave Uma Iara/Uma
perigosa Yara, de Adriana Calcanhotto, sobre texto de Clarice Lispector, e a
bossa canção Dindi (Tom Jobim/Aloysio de Oliveira).
Coisas do Arco da Velha
Índia, como biografa o amigo Chico César: É corda vocal insubmissa/rabeca de
uma corda/que em desacordo atiça/a aldeia contra o futuro.
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