Programa de governo reafirma
pontos como manter o 'tripé econômico'. Propõe ainda Escola em Tempo Integral,
Passe Livre para alunos do ensino público, Bolsa Família, 10% da receita da
União para a Saúde, fim do Fator Previdenciário e Casamento Gay.
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A candidata à Presidência da República pelo PSB, Marina
Silva, e o vice, Beto Albuquerque, durante cerimônia de lançamento de seu
programa de governo, em São Paulo (Paulo Whitaker/Reuters)
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Marina Silva e seu vice,
Beto Albuquerque, apresentaram na sexta-feira, 29 o programa de governo de mais
de 240 páginas da coligação pela qual disputam a Presidência da República.
Trata-se de uma versão ampliada do documento entregue ao Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) em julho, quando Eduardo Campos ainda era o candidato da chapa.
A agenda econômica ganha destaque no texto por ser justamente o segmento que
suscita maior preocupação hoje — e também para 2015. A equipe de Marina,
capitaneada pelo economista Eduardo Giannetti da Fonseca, redigiu pouco mais de
50 páginas de um programa econômico que resgata a ortodoxia perdida nos
governos petistas, detalhando mudanças estruturais que podem ser feitas se a
ex-senadora for eleita presidente. Se, no discurso político, Marina preferiu
destacar medidas com maior apelo popular, como o passe livre para estudantes e
o aumento da verba para a Saúde, a pauta econômica evidencia uma ânsia por
ajustes e liberalização de mercado. O programa não mostra, no entanto, como um
possível governo peessebista faria para equalizar um ajuste fiscal
imprescindível com o aumento de gastos sociais.
Na apresentação, o partido
faz uma homenagem a Campos para deixar registrado que ele participou e revisou
até as últimas versões do texto, que é dividido em seis eixos principais que já
haviam sido divulgados pelo PSB como bases das propostas de governo. São os
seguintes: Estado e Democracia de Alta Intensidade; Economia para o
Desenvolvimento Sustentável; Educação, Cultura e Ciência, Tecnologia e
Inovação; Políticas Sociais, Saúde e Qualidade de Vida; Novo Urbanismo,
Segurança Pública e o Pacto pela Vida; Cidadania e Identidades.
Leia também: O que esperar
da equipe econômica de Marina
No centro da cartilha, os
candidatos reafirmam o compromisso com pontos já adiantados ao longo da
campanha, como o "tripé econômico" – sistema composto por meta de inflação,
câmbio flutuante e rigor fiscal — e a independência do Banco Central garantida
por lei. Hoje, o presidente do BC, apesar de ser técnico, é nomeado pelo
governo, assim como toda a sua diretoria. Segundo o texto, a falta de autonomia
do BC faz com que o órgão não tenha, necessariamente, compromisso com o
cumprimento da meta de inflação, algo que contribui para a perda de
credibilidade da economia brasileira.
A equipe de Marina propõe
ainda a criação de Conselho de Responsabilidade Fiscal, um órgão teoricamente
independente do governo cuja função é avaliar o cumprimento das metas fiscais e
a qualidade dos gastos públicos. Tal mecanismo tem clara inspiração no comitê
orçamentário dos Estados Unidos, que não é partidário. Ainda que Republicanos e
Democratas se engalfinhem para conseguir aprovar ou vetar gastos, há um time
técnico e isento por trás que apresenta os números tal como são. E, em muitos
casos, suas projeções são alinhadas com as do Fundo Monetário Internacional
(FMI).
O eixo principal do programa
econômico é, segundo o texto, diminuir o peso do estado (e das estatais) na
economia e estimular o desenvolvimento do mercado de capitais como motor de
financiamento de projetos — em especial os de infraestrutura. Sobre as
estatais, o documento afirma claramente a intenção de "eliminar a prática
de usá-las como instrumento de política macroeconômica". Subsídios a
setores específicos também são alvo de críticas no programa, pois "reduzem
a eficiência na alocação de recursos e comprometem o crescimento econômico,
entre outras coisas, por causa das incertezas geradas quanto a preços
relativos". O objetivo final desse novo modelo é aumentar a competitividade
e eficiência das empresas. "Deixar a economia respirar", diz o texto.
O detalhamento proposto é
visto como o ideal para uma economia de mercado. Contudo, o que Marina não
explica é se, caso se eleger, retirará, de fato, todos os estímulos já
colocados em prática pelo governo atual, como o Inovar-Auto no setor automotivo
e as desonerações tributárias concedidas a setores específicos da economia. Há
ainda as políticas de conteúdo nacional no setor de óleo e gás e a política de
compras governamentais, que permite que o governo pague mais caro por produtos
fabricados no Brasil do que por importados, mesmo em caso de licitação.
Trata-se, assim, de um programa que, para ser implementado, terá de
desconstruir decretos e leis já aprovadas no Congresso.
Conseguir apoio para
empreender mudanças é um dos pontos que mais suscitam dúvidas em relação à
candidatura da ex-senadora. Segundo seu programa, uma reforma política é
imprescindível para que as promessas saiam do papel. Além de propor mudanças no
modo de escolha do Legislativo – como a defesa da candidatura avulsa –, o texto
defende que o Estado precisa se modernizar por meio do fortalecimento de suas
instituições. Nesse âmbito, Marina defende proposta semelhante à de seu
adversário Aécio Neves (PSDB): o fim da reeleição e coincidência dos mandatos,
com duração de cinco anos. Tais mudanças, segundo a candidata, viram uma
"maior participação popular", de modo a haver uma
"democratização da democracia".
Mais vago que o programa
econômico, o texto político afirma que é preciso mudar as regras para a
competição entre os partidos, especialmente os modos de financiamento de
campanha. Valendo-se das manifestações de junho de 2013, o programa aponta
ainda que é preciso criar novos mecanismos de participação, com o uso da tecnologia,
além de fortalecer os já existentes, como plebiscitos, consultas populares e
conselhos sociais. "As manifestações recentes demandam que se ampliem os
espaços públicos de discussão, maior inserção nos processos políticos e
exercícios de cidadania", diz o texto, num tom de manifesto
"sonhático".
Leia outros pontos
defendidos pelo programa do PSB:
Saúde – O programa sugere a
criação do Saúde +10, que já havia sido anunciado pelo partido. Com a medida, é
previsto que 10% da Receita Corrente Bruta do país sejam destinados a ações na
área de saúde. Sobre o aborto, o programa não fala em legalização, mas destaca
a necessidade de consolidar no Sistema Único de Saúde (SUS) “os serviços de
interrupção da gravidez conforme legislação em vigor”.
Educação – O programa prevê
medidas na área de educação para valorizar o professor e ampliar o acesso ao
ensino. A escola e tempo integral, uma das principais bandeiras de Campos
durante seu governo em Pernambuco, também é listada. Outra proposta
implementada em Pernambuco e que está prevista no plano e governo é o programa
“Ganhe o mundo”, que promove o intercâmbio para estudantes do ensino médio da
rede pública. As propostas não trazem metas muito claras para a educação, mas
os candidatos se comprometem a acelerar a implantação do Plano Nacional para a
Educação (PNE), que já foi aprovado pelo Congresso Nacional e garante 10% do
Produto Interno Bruto (PIB) para a educação. Sobre as cotas raciais, os
candidatos veem a medida como temporária. “Reafirmar importância das cotas para
a população negra brasileira, como medida temporária, emergencial e reparatória
da dívida histórica, com data prevista para terminar”, diz o texto.
Casamento gay – No programa,
consta a defesa do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Por ser evangélica,
Marina é frequentemente questionada sobre sua posição sobre o casamento gay.
Ela vinha afirmando que defende a garantia dos direitos civis ao casamento de
pessoas do mesmo sexo, mas que cabe a cada igreja aceitar ou não a união.
"Não podemos mais permitir que os direitos humanos e a dignidade das
minorias sexuais continuem sendo violados em nome do preconceito. O direito de
vivenciar a sexualidade e o direito às oportunidades devem ser garantidos a
todos, indistintamente", diz uma parte do programa divulgado hoje.
Bolsa Família – Sobre o
Bolsa Família, Marina defende que o programa seja uma política pública de
Estado, “assegurando sua continuidade mesmo com as alternâncias do governo”. O
programa acrescenta ainda que a intenção é incluir no Bolsa Família todas as
famílias cujo perfil preencha os critérios do programa.
Fator previdenciário – O fim
do fator previdenciário, que define idade mínima para aposentadoria, também
aparece entre as propostas de Marina. Embora não deixe claro como pretende
modificar o sistema, a candidata se compromete a rever a regra. “A coligação
Unidos pelo Brasil propõe a busca de alternativa ao fator previdenciário que
concilie os princípios de justiça – beneficiando quem mais cedo começou a
trabalhar, computando tempo suficiente para o custeio do seu benefício, e
evitando, ao mesmo tempo, a imprevisibilidade derivada do fator previdenciário,
que sofre alteração a cada ano, à medida que se eleva a expectativa de vida da
população. Uma fórmula numérica que elimine o fator negativo, ou seja, a
redução do benefício, a partir de certo patamar, parece ser defensável e
suficiente para mitigar os efeitos perversos do fator.
Fonte: Talita Fernandes/Veja