segunda-feira, 27 de maio de 2013

0 O CRONISTA DECRÉPITO

Opinião

Por Rubens Coelho – Jornalista em 25/05/2013 às 14:53

Jornalista de profissão, no tempo em que exercê-la não precisava de diploma, mas carecia de conhecer bem a língua pátria, a bela língua de Camões, manejá-la com sabedoria e elegância. Eram elementos essenciais para se tornar um bom articulista.

Pois bem, o personagem que aqui relatarei era a junção de tudo isso e mais a vivacidade de uma pessoa insinuante e inteligente, como se diz atualmente, antenado nas coisas da comunidade da qual era integrado. Como profissional, ocupou diversas posições nos jornais onde atuou: repórter, jornalista político, diretor de redação, mas seu destaque maior foi o de cronista. Os leitores liam as estórias do cotidiano magistralmente discorridas por ele com avidez, era um sucesso literário.

Bem-sucedido, inclusive economicamente, nosso cronista assim pôde realizar algumas viagens ao exterior, quando a época não era globalizada, então ir ao estrangeiro ficava para poucos privilegiados. Mas o nosso cronista conseguiu essa proeza. Roma, Paris, especialmente Lisboa eram seus destinos preferidos. Cada périplo desses o motivava a escrever inúmeras crônicas sobre os lugares visitados, suas aventuras gastronômicas nas mais diversas casas de pastos, os points da moda com seus gourmets, vinhos famosos, tudo era descrito nos mínimos detalhes, muitas vezes usando termos lusitanos, não usual entre os brasileiros.

A realidade foi mudando, o mundo se transformando, se globalizando, o avanço tecnológico, a comunicação eletrônica, a internet estreitando espaço, diminuindo o tempo, a distância e aumentando o conhecimento das pessoas. Entre os vários termos dessa nova era, surgiu o chamado internauta, ou navegadores da internet. Verdadeira revolução de costumes e comportamental das pessoas.

Tudo isso aconteceu e está acontecendo, mas o nosso cronista permaneceu escrevendo sobre suas turnês, comidas, vinhos ingeridos, enfim, suas degustações, sem nada de novo apresentado aos leitores, mesmos os mais velhos, pois para os jovens vivendo no mundo eletrizante dos Twitters, Facebooks e outras parafernálias da internet, distante da leitura, especialmente de textos gongóricos, superados, bolorento, do nosso autor, sua situação foi se complicando, se desprestigiando até perder o espaço nobre onde no jornal eram publicadas suas crônicas, que passaram a ocupar um cantinho escondido, no terceiro caderno dedicado aos classificados de venda imóveis e automóveis.

Um dia, nosso jornalista-cronista resolveu reclamar da situação ao dono do jornal. A resposta do jovem diretor da terceira geração de proprietários do periódico foi fulminante: olha, cara, você foi um bom jornalista, mas hoje está ultrapassado, decrépito, se quiser continuar publicando suas crônicas anacrônicas, o faça, mas o espaço concedido é onde você está dispondo agora, certo?

Foi um momento triste. Nosso cronista, amargurado, decepcionado, naquele dia escreveu a melhor crônica da sua longa carreira: despedindo-se da profissão, da escrita e da vida. 

Fonte: Jornal Gazeta do Oeste 

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